Quando a Escola identifica o Autismo e a Familia não reconhece
💞Estudo de Caso: Quando a Escola Identifica o Autismo e a Família Não Reconhece
✍️Por Ednalva Brito de Melo – Psicopedagoga
No ambiente escolar, muitas vezes, a professora é a primeira a perceber quando uma criança apresenta sinais que podem indicar algum transtorno do desenvolvimento. A convivência diária em sala de aula, a observação constante do comportamento e da aprendizagem, bem como o contato com diferentes crianças, oferecem condições para que o docente identifique padrões que se destoam do esperado para a idade. Foi exatamente isso que ocorreu em um caso que chegou até nós, envolvendo uma criança em idade escolar que apresentava características compatíveis com o Transtorno do Espectro Autista (TEA).
A professora, atenta e sensível, notou comportamentos repetitivos, dificuldade de interação com os colegas, resistência a mudanças de rotina e formas peculiares de brincar. Preocupada, buscou apoio junto à equipe multidisciplinar da escola, composta por psicopedagogo, psicólogo e orientador educacional. Após observações e registros sistemáticos, o grupo decidiu chamar os pais para uma conversa. O objetivo não era rotular a criança, mas abrir um espaço de diálogo e refletir sobre a importância de compreender melhor o que estava acontecendo.
No entanto, o encontro revelou um desafio que, infelizmente, não é raro: a resistência familiar. Os pais negaram que o filho pudesse apresentar algum transtorno. Afirmaram que em casa “ele é uma criança normal” e justificaram determinados comportamentos como sendo apenas “jeitos divertidos” da personalidade da criança.
Esse tipo de negação por parte da família merece uma reflexão cuidadosa. Muitas vezes, ela não nasce da falta de amor, mas do medo. O diagnóstico de autismo ainda carrega consigo preconceitos e estigmas sociais. Pais e mães podem sentir culpa, vergonha ou até mesmo receio de que o filho seja discriminado. A negação aparece, então, como uma forma de defesa emocional diante de algo que parece doloroso demais de aceitar.
Entretanto, é fundamental compreender que o reconhecimento precoce do TEA faz toda a diferença no desenvolvimento da criança. O diagnóstico não deve ser visto como um “rótulo”, mas como uma oportunidade de oferecer apoio, intervenções adequadas e estratégias pedagógicas que favoreçam o aprendizado e a socialização. Quanto antes a criança tiver acesso a acompanhamento especializado, maiores serão suas possibilidades de desenvolver habilidades comunicativas, cognitivas e sociais.
Voltando ao caso em questão, algo chamou ainda mais a atenção: os comportamentos que a professora havia descrito manifestaram-se diante dos próprios pais durante o encontro. Mesmo assim, eles minimizaram a situação, dizendo frases como “ele é assim mesmo” ou “é porque é divertido”. Essa reação evidencia como, muitas vezes, o amor parental pode se confundir com a recusa em enxergar uma realidade que exige ação imediata.
A escola, nesse contexto, tem um papel essencial de mediação. Não basta apontar o problema; é necessário construir pontes de confiança com a família, utilizando linguagem acolhedora e livre de julgamentos. O acolhimento deve vir antes da informação técnica. É preciso escutar os pais, entender seus receios e, a partir daí, apresentar dados e orientações de forma clara, sem impor, mas mostrando os benefícios do acompanhamento.
Outro ponto importante é a parceria com serviços de saúde. O encaminhamento da criança para avaliação médica especializada – geralmente com neuropediatra ou psiquiatra infantil – precisa ser feito de maneira responsável e dialogada. Além disso, o acompanhamento de psicopedagogos, terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogos e psicólogos pode contribuir para uma intervenção mais ampla e eficaz.
Para os professores, esse caso também deixa aprendizados valiosos. O olhar pedagógico é um dos primeiros filtros que permitem identificar o autismo. Mas é essencial que essa percepção seja acompanhada de registros, relatórios descritivos e reuniões periódicas com a equipe escolar. Isso fortalece a credibilidade do processo e evita que a família interprete como “implicância” ou julgamento precipitado.
Do lado da família, o convite é para uma reflexão corajosa. Aceitar que o filho pode apresentar um transtorno não significa amá-lo menos, mas reconhecê-lo em sua singularidade e proporcionar-lhe condições para florescer. O TEA não define a criança por completo, mas é uma parte de quem ela é – e merece ser compreendido e respeitado.
É importante também lembrar que a escola sozinha não consegue promover todas as mudanças necessárias. A participação da família no processo é determinante para o sucesso da intervenção. Quando pais, professores e profissionais de saúde caminham juntos, a criança encontra um espaço de acolhimento e possibilidades reais de progresso.
Conclusão
O estudo de caso apresentado mostra a delicada relação entre escola e família quando se trata de identificar sinais do autismo. De um lado, temos a observação atenta dos professores e o compromisso da equipe multidisciplinar. De outro, a negação dos pais, movida por medos e crenças que dificultam o reconhecimento da realidade.
No entanto, negar não elimina os sinais. A criança continua manifestando comportamentos que precisam ser compreendidos. Por isso, o diálogo aberto, a escuta acolhedora e a parceria entre escola e família são fundamentais para transformar a vida da criança.
Reconhecer o autismo não é uma sentença, mas um passo de esperança. É abrir portas para que a criança desenvolva seu potencial com apoio, amor e respeito. Afinal, cada criança, com ou sem diagnóstico, tem direito a aprender, brincar, sonhar e ser feliz.
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Texto elaborado por: Ednalva Brito de Melo – Psicopedagoga
✍️(Coluna Social Educativa – 29 de agosto de 2025)
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